ATA DA VIGÉSIMA PRIMEIRA SESSÃO SOLENE DA PRIMEIRA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA DÉCIMA PRIMEIRA LEGISLATURA, EM 02.12.1993

 


Aos dois dias do mês de dezembro do ano de mil novecentos e noventa e três reuniu-se, na Sala de Sessões do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre, em sua Vigésima Primeira Sessão Solene da Primeira Sessão Legislativa Ordinária da Décima Primeira Legislatura. Às quinze horas e vinte e três minu­tos constatada a existência de “quorum”, o Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos da presente Sessão, destinada à entrega do Prêmio Literário Érico Veríssimo ao Jornalista e Escritor Liberato Figueiredo Vieira da Cunha, conforme Projeto de Resolução nº 53/91 (Processo nº 2959/91) , de autoria do Vereador Isaac Ainhorn. Compuseram a MESA: Vereador Airto Ferronato, 1º Secretário da Câmara Municipal de Porto Alegre, no exercício da Presidência; Doutor Voltaire de Lima Moraes, Procurador-Geral de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul; Doutor Dilamar Valls Ma­chado, Secretário de Comunicação do Estado, representando o Se­nhor Governador; Doutor Luiz Paulo Pilla Vares, Secretário Municipal da Cultura, representando o Senhor Prefeito Municipal de Porto Alegre; Jornalista Firmino Cardoso, representando a Associação Riograndense de Imprensa; Jornalista Lauro Schirmer, Di­retor Coordenador Editorial da Rede Brasil Sul de Comunicações; Jornalista e Escritor Liberato Figueiredo Vieira da Cunha, Homenageado e o Vereador Isaac Ainhorn, Secretário “ad hoc”. A se­guir, o Senhor Presidente convidou a todos para, de pé, assistirem à execução do Hino Nacional Brasileiro e, após, concedeu a palavra aos Vereadores que falariam em nome da Casa. O Vereador Isaac Ainhorn, como autor da proposição e em nome das Bancadas do PDT, PTB, PPR, PMDB, PC do B, PFL e PPS, disse ser hoje, um daqueles momentos muito especiais, por esta Casa estar homenageando o jornalista, cronista e escritor Liberato Figueiredo Vieira da Cunha, justamente quando seu primeiro romance “As Torrentes de Santaclara” ostenta a marca da mais vendida obra de ficção literária da Feira do Livro de Porto Alegre. Discorreu sobre a vida profissional do Homenageado, dizendo ser ele autor de centenas de crônicas, contos e artigos difundidos no Rio Grande do Sul e no centro do País, tendo conquistado cinco prêmios regionais e um nacional de jornalismo literário. Salientou seu extremo amor por Porto Alegre e a maestria de sua pena que “transforma quase em poesia uma crônica criticando as autoridades municipais que seccionaram a Avenida Borges de Medeiros ao tráfego de veículos e “modernizaram” a Rua da Praia, condenando o centro da cidade ao abandono, à falta de gente, à ausência dos cafés e casas de chá de outrora”. Finalizando, lamentou que o Jornalista Elcyr Silveira não mais esteja conosco. O Vereador João Motta falou acerca das palavras do escritor Ítalo Calvino que em um de seus livros nos diz que “dentro desse mundo de concreto existem praticamente muitas cidades, que aos nossos olhos se tornam invisíveis, mas que um olhar um pouco mais atento e sensível poderia mergulhar nesse mundo invisível através da criação e da imaginação”. Esse mundo seria o mundo do escritor, da literatura, que tem um contato muito especial, que é um contato com o coração, a alma e o desejo humano e que somente cidadãos com a sensibilidade como a do nosso homenageado poderia ver e sentir. Disse que a Bancada do PT reafirma a esperança de poder­mos construir um País mais justo e mais digno para todos nós. O Vereador Antonio Hohlfeldt disse ter convivido com o homena­geado no jornalismo e na literatura, tendo ficado com uma ótima impressão desse homem tranqüilo. Ressaltou ser muito difícil conciliar o trabalho de jornalista e de escritor pois o tempo disponível para escrever acaba sendo roubado pelo jornal, sobrando muito pouco tempo para a literatura, mas que o homenageado encontrou uma saída inteligente e eficiente: virou cronista, podendo, assim, dar asas a sua imaginação e, a partir daí, es­crever um grande romance com muitas personagens e enredo complexo e, ao mesmo tempo, enfrentar o dia-a-dia do jornal. Disse ser esta homenagem mais do que justa e esperar que o Senhor Liberato Figueiredo Vieira da Cunha continue dando essa dupla contribuição dentro do jornalismo e da literatura. A seguir, o Senhor Presidente registrou as presenças de Flávia Vieira de Cunha, Lúcia Vieira da Cunha, esposa, filha e demais familiares do homenageado, bem como do Jornalista Renato Davi, da Professora Antonieta Baroni, Presidente da Aliança Francesa, do Jornalista Carlos Bastos, da Senhora Eunice Jaques, da Senhora Maria do Horto Martins, representando o Solar dos Câmara, da Senhora Andréa Rotuno, Coordenadora do Livro e da Literatura da Secretaria Muni­cipal da Cultura, e do Senhor Carlos Renato Bandeira, Diretor Comercial do Grupo Habitasul. Em continuidade, o Senhor Presidente convidou a todos para, de pé, assistirem a entrega do Diploma pelo Vereador Isaac Ainhorn ao Homenageado. Após, o Senhor Presidente concedeu a palavra ao Senhor Liberato Figueiredo Vi­eira da Cunha que falou dos laços profundos que o unem a esta terra de adoção e a admiração que devota à obra de Érico Veríssimo. Despediu-se agradecendo e manifestando seu reconhecimento pelo prêmio recebido. Às dezesseis horas e cinco minutos o Senhor Presidente declarou encerrados os trabalhos, convidando para a Sessão Solene a seguir. Os trabalhos foram presididos pelo Vereador Airto Ferronato e Secretariados pelo Vereador Isaac Ainhorn, como Secretário “ad hoc”. Do que eu, Isaac Ainhorn, Secretário “ad hoc”, determinei fosse lavrada a presente Ata que, após distribuída em avulsos e aprovada, será assinada pelos Se­nhores 1º Secretário e Presidente.

 

 


O SR. PRESIDENTE: Ao iniciarmos, eu gostaria de registrar, em meu nome particular, em nome da Mesa Diretora da Câmara Municipal de Porto Alegre que, para nós, é motivo de satisfação presidirmos esta Sessão que tem por autor do Requerimento o Ver. Isaac Ainhorn, aprovado por unanimidade da Casa, que concede o Prêmio Literário Érico Veríssimo ao eminente jornalista e escritor Liberato Vieira da Cunha, nome que engrandece a cultura do nosso Estado.

Convidamos a todos para, em pé, ouvirmos o Hino Nacional.

 

(É executado o Hino Nacional.)

 

O SR. PRESIDENTE: Passamos a palavra ao Ver. Isaac Ainhorn, proponente desta homenagem, que falará em nome de sua Bancada, o PDT, e pelas Bancadas do PTB, PMDB, PPR, PC do B, PFL e PPS.

 

O SR. ISAAC AINHORN: Exmo Sr. Airto Ferronato, no exercício da Presidência dos trabalhos desta Sessão Solene; Exmo Sr. homenageado, jornalista e escritor Liberato Figueiredo Vieira da Cunha; Exmo Procurador-Geral de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Dr. Voltaire de Lima Moraes; Exmo Sr. Secretário de Comunicação Social do Estado do Rio Grande do Sul, neste ato representando S. Exª o Governador do Estado, o advogado e jornalista Dilamar Machado; Exmo Sr. Secretário Municipal de Cultura, nesta oportunidade representando o Exmo Sr. Prefeito Municipal de Porto Alegre, Dr. Tarso Genro, o jornalista Luiz Paulo Pilla Vares; Exmo Sr. Representante da ARI, jornalista Firmino Cardoso; Exmo Sr. Diretor-Coordenador Editorial da Rede Brasil Sul, jornalista Lauro Schirmer; prezado escritor Mozart Soares, Diretor da Biblioteca Pública do Estado do Rio Grande do Sul; familiares; minhas Senhoras e meus Senhores.

Este Legislativo vive hoje um daqueles momentos de incrível felicidade para a história desta Casa e desta mui leal e valerosa cidade de Porto Alegre. É um momento em que estamos todos aqui reunidos para laurear, em preito de reconhecimento, o jornalista, cronista e escritor Liberato Figueiredo Vieira da Cunha com o Prêmio Literário Érico Veríssimo, instituído pela Câmara Municipal de Porto Alegre em 1979.

Nada mais oportuno do que entregar este laurel a Liberato Figueiredo Vieira da Cunha no exato momento em que seu primeiro romance, “As Torrentes de Santaclara”, recém-lançado, já ostenta a marca da mais vendida obra de ficção literária na nossa recentemente encerrada Feira do Livro de Porto Alegre, assim como em diversas promoções similares organizadas em cidades do interior gaúcho.

É mais do que justo que Liberato Figueiredo Vieira da Cunha receba este prêmio no momento em que seu “As Torrentes de Santaclara” retoma uma senda que registra uma tradição de excelência nos romances produzidos por gente do Rio Grande: a das sagas familiares, da qual o autor maior é justamente aquele que empresta seu nome a esta premiação, o inesquecível Érico Veríssimo.

A série de agradáveis coincidências não se encerra por aí. Como Érico, nosso homenageado de hoje, Liberato Figueiredo Vieira da Cunha, é um homem do nosso interior que chegou à Capital e tomou-a com sua cidade do coração, aqui crescendo, evoluindo profissionalmente e passando a fazer parte ativa de seu cotidiano.

Natural de Cachoeira do Sul, onde nasceu em 25 de maio de 1945, Liberato Figueiredo Vieira da Cunha completou o 1º e 2º graus em Porto Alegre, nos colégios Nossa Senhora das Dores e Anchieta, bacharelado-se em Ciências Jurídicas e Sociais pela UFRGS, em 1967.

Mas foi no jornalismo, entranhado no sangue desta família cachoeirense, que encontrou seu verdadeiro caminho. Tanto que já aos 14 anos de idade iniciava-se na profissão, atuando no “Jornal do Povo”, editado naquela cidade. Como jornalista profissional destacou-se no “Diário de Notícias”, onde foi secretário de Redação de 1967 a 1969; no “Correio do Povo”, onde foi editor de diversos setores de 1969 a 1984; e na “Folha da Tarde”, onde exerceu a Secretaria de Redação em 1971. Desde 1984 está atuando em “Zero Hora”, onde atualmente integra a Editoria de opinião e mantém coluna de crônica. Como jornalista foi ainda correspondente internacional em diversos países e participou de cursos sobre política na Alemanha e nos Estados Unidos.

Igual brilho alcança a participação de Liberato Figueiredo Vieira da Cunha na literatura rio-grandense, autor de centenas de contos, crônicas e artigos difundidos na imprensa do Rio Grande do Sul e do Centro do País, antes de concluir seu primeiro romance, publicou três livros de contos e crônicas: “Miss Falklands”, editado pela Martins Livreiro, em 1983; “Um Hóspede na Sacada”, da Sulina, em 1985; e a “Mulher de Violeta”, da Editora Tchê!, em 1990. Participou de antologias e/ou obras coletivas como “Rodízios de Contos”, da Mercado Alberto, 1985; “Sombras e Luzes - Um olhar Sobre o Século”, da LPM, em 1989; e “Cem Anos na Frente”, da Evolução, em 1990.

Mercê de seu talento, conquistou cinco prêmios regionais (categoria crônica) e um nacional de jornalismo literário.

Nas crônicas semanais que mantém em “Zero Hora”, Liberato Figueiredo Vieira da Cunha tem reiterado seu extremo amor por nossa Porto Alegre, ajudando a todos nós a descobrirmos muitas das surpresas que ela nos reserva, aliando a confusão de uma Cidade que cresce e se transforma a locais bucólicos e que ainda guardam a imagem de tranqüilidade e paz de décadas passadas. Usando com maestria sua pena, Liberato nos fala com emoção de uma araucária que descobriu no jardim de uma mansão no Bairro Moinhos de Vento ao olhar pela vidraça de uma sala de espera de um dos tantos gigantes de concreto, vidro e aço que alteraram complemente a imagem urbana daquela zona da Cidade; e com a mesma propriedade transforma quase em poesia uma crônica criticando as autoridades municipais que seccionaram a Avenida Borges de Medeiros ao tráfego de veículos e “modernizaram” o pavimento da Rua da Praia, condenado o Centro da Cidade ao abandono, à falta de gente, à ausência dos cafés e casas de chá de outrora.

É este homem sensível e aguçado observador de tudo aquilo que o cerca que hoje temos a satisfação de homenagear. É lastimável que não esteja aqui conosco o saudoso Elcyr Silveira, também jornalista e por muitos anos colega de Liberato no “Correio do Povo”. Elcyr, meu caro Liberato, foi o verdadeiro autor da proposta desta homenagem, cabendo-me apenas, como Vereador e seu amigo pessoal, torná-la concreta.

Com “As Torrentes de Santaclara”, Liberato nos faz ávidos sorvedores da história que abrange quase um século da família Dória que vê seu poderio e influência exercidos na fictícia cidade situada às margens do rio Jacuí desvanecerem-se e darem lugar à pobreza, situação esta que só será revertida através da figura central do romance, Leandro Dória. Do final do século XIX aos anos 80, Liberato Figueiredo Vieira da Cunha nos torna leitores vorazes das pouco mais de 600 páginas de seu romance. E nos envolve com o suspense, as incertezas políticas, e, especialmente, com os desejos, desencontros e dramas que palmilham a trajetória de seus personagens, seres humanos em que, certamente, muitos de nós identificaremos sonhos, desejos e tragédias comuns a qualquer integrante de nossa sociedade.

“As Torrentes de Santaclara” é como que a culminância de um trabalho tecido com paciência e competência ao longo de muitos anos por este jornalista, cronista e escritor que todos nós aprendemos a respeitar e admirar. Ele inscreve definitivamente Liberato Figueiredo Vieira da Cunha no quadro de destaque da moderna literatura deste País. E nos dá prova de quão justa e oportuna é a homenagem que hoje aqui prestamos a este destacado gaúcho.

Um romancista de mão cheia que honra sobre maneira este Prêmio Literário Érico Veríssimo. Muito obrigado.

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Entre outras presenças, gostaríamos de registrar a presença da Srª Flávia Vieira da Cunha, esposa do homenageado, da Srta Lúcia Vieira da Cunha, filha do homenageado, do Sr. Carlos Salzano Vieira da Cunha, tio do homenageado, do Sr. José Vieira da Cunha, primo do homenageado, do Sr. Carlos Eduardo Vieira da Cunha, nosso sempre Vereador e Presidente da CEEE, primo do homenageado, do Jornalista Renato Davi, da Profª Antonieta Baroni, que é Presidente da Aliança Francesa, do Jornalista Carlos Bastos e ex-Secretário de Comunicação Social do Governo do Estado, da Jornalista Eunice Jaques, da Drª Maria do Horto Martins, representado o Solar dos Câmara, da Andréa Rotuno, Coordenadora do Livro e Literatura da Secretaria Municipal de Cultura, do Dr. Carlos Renato Bandeira, Diretor Comercial do Grupo Habitasul.

Com a palavra, o Ver. João Motta, que falará em nome da Bancada do PT.

 

O SR. JOÃO MOTTA: Sr. Presidente, Srs. Vereadores. (Menciona os demais componentes da Mesa.) Companheiros e companheiras presentes neste ato de entrega do Prêmio Literário Érico Veríssimo.

Serei breve, mas gostaria de, neste breves momentos, dividir com vocês um pouco daquilo que aprendemos ao conviver com outros trinta e dois Vereadores nesta Casa, durante cinco anos, no exercício dessa função pública, que é ser Vereador numa cidade como Porto Alegre.

O escritor Ítalo Calvino nos ensina, com muita propriedade, em um de seus livros, que as cidades, na verdade, não são só aquilo que o mundo mais concreta e mais objetivo apresenta; ao contrário, ele diz que dentro deste mundo, o mundo do concreto, existem praticamente muitas outras cidades que, aos nossos olhos, se tornam invisíveis e que, de certa forma, fogem do nosso olhar. Mas, um olhar um pouco mais atento e sensível poderia mergulhar neste mundo invisível através da criação e da imaginação.

Diria, portanto, que a cidade de Porto Alegre, além desse mundo, o da política, como é o caso da Câmara Municipal; do chamado mundo da marginalização social, como é o caso das inúmeras vilas da periferia da Cidade; como é o caso do mundo da arquitetura e das obras de arte, os viadutos e pontes que existem na Cidade; diria que existem, sim, em Porto Alegre este mundo visto pelo escritor: o mundo da literatura. Existe o mundo das esquinas que, recentemente, o Vereador Dilamar Machado nos brindou com uma obra lançada na Feira do Livro.

Existe, também, o mundo do Castelinho, que outro escritor, o Juremir Machado, nos brindou com um livro sobre esse tema.

Pois bem, quero dizer com tudo isto que o Ítalo Calvino tinha razão de fato, pelo menos, estou convencido disto. Existe todo esse mundo em que somente aqueles que transformam a arte de escrever, através dos trabalhos artísticos de prosa, verso ou até mesmo crônicas, têm um contato muito especial, que é um contato com o coração, a alma e o desejo humano. E que somente cidadão com esta sensibilidade, como é a sensibilidade do nosso homenageado, poderia ver e sentir.

Por isso, me sinto muito honrado, em nome da Bancada o PT, em momentos raros na Câmara Municipal, como esse, nós também reconhecermos a existência desse outro lado da cidade de Porto Alegre.

E quando fazemos este reconhecimento, simbolicamente, hoje, através desta homenagem, resgatamos aquilo que aprendi nesta convivência com os outros 32 Vereadores, que é uma síntese da cidade de Porto Alegre, ou seja, uma Cidade que incorpora as diferenças, que convive com as diferenças. E, aliás, não poderia deixar de ser assim, porque o mundo da alma e do desejo humano é um mundo de fato infindável, como nos ensina Ítalo Calvino. E como, através desse última obra, as Torrentes de Santa Clara, e através dessa textura feita pelo escritor Liberato, nós também, mais uma vez, fizemos este mergulho.

Gostaria de encerrar, além de dizer isto que acabo de sintetizar, dizendo que a nossa Bancada nesses momentos reafirma uma esperança, que reconheço nos dias que vivemos ser muito difícil, mas nos inspiramos nessa tecitura do escritor e jornalista que estamos homenageando hoje, para executarmos essa tarefa muito difícil de construirmos uma sociedade e um País digno e justo para todos nós.

Portanto, essas eram as nossas palavras de homenagem ao Liberato, nosso escritor e mais um cidadão que se incorpora naquele rol dos homenageados da Câmara Municipal de Porto Alegre. Não é uma obrigação nossa, mas acho que a Câmara dá uma demonstração, também, com essa homenagem, da sua sensibilidade a esse outro mundo que muitas vezes nos é estranho, mas deve ser reconhecido e respeitado por todos nós. Muito obrigado.

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: O Ver. Antonio Hohlfeldt está com a palavra pelo PSDB.

 

O SR. ANTONIO HOHLFELDT: Prezado companheiro Ver. Airto Ferronato, no exercício da presidência desta Casa neste momento; prezado Liberato - não vou dizer Figueiredo porque isso traz má lembranças a todos nós - mas Vieira da Cunha, que é como o conheci dentro da redação do “Correio do Povo” durante a vida inteira; prezado Voltaire de Lima Moraes, Procurador-Geral de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul; prezado Ver. Dilamar Machado, que ficou com tanta saudade que saiu ontem daqui e já voltou hoje, para a representação do Sr. Governo do Estado, hoje ocupando um cargo importante dentro da Administração Estadual; prezado companheiro Luiz Paulo de Pilla Vares, Secretário Municipal da Cultura, representando o Prefeito Tarso Genro; prezado Embaixador Firmino Cardoso, sempre em nome da Associação Rio-Grandense de Imprensa; prezado companheiro Lauro Schirmer, representado a RBS; minhas Senhoras e meus Senhores, especialmente o Ver. Isaac Ainhorn, proponente desta homenagem; vejo, aqui, a Srª Antonieta Baroni, minha professora de tantos anos; Tânia Carvalhal; o prof. Mosar Pereira Soares; enfim, tantos amigos, tantos companheiros.

Realmente é um desses momentos muito importantes em que não enfrento essa distância que o Ver. Motta mencionou, porque antes da experiência político-partidária, tive justamente a dupla experiência do Liberato: a experiência do jornalismo que apaixona todos nós e a experiência da literatura. No caso do jornalismo, tive a alegria de, ao longo de muitos anos, não apenas trabalhar na mesma redação do Liberato, mas de ser chefiado pelo Liberato enquanto editor do chamado Caderno Especial, do “Correio do Povo”, era com ele que eu tratava a cada semana, na editoria de determinadas matérias que eram preparadas com antecedência. E desta época sempre me ficou uma imagem extremamente positiva do Liberato. Em primeiro lugar, a sua tranqüilidade - os que conhecem uma redação de jornal sabem. Hoje já está meio aplainada, meio mortificada, com negócio de computadores, ela já ficou meio frígida. Mas naqueles bons tempos de redação, de barulho de máquinas de escrever, de telex chegando, de jornalista entrando e saindo, repórter querendo arranjar furo, o Liberato era uma ilha de tranqüilidade: andava de uma lado para o outro coordenando a editoria do Caderno, controlando a chegada das matérias, eventualmente, discutindo um tom sempre tranqüilo em relação ao tema, eventualmente, ao enfoque do material e, sobretudo, provocando, dentro de determinadas idéias, quando ele achava que deveria surgir uma matéria, se deveria abordar determinado tema e se eventualmente o repórter ou colaborador não estivesse muito interessado, o Liberato, aí , tinha toda uma maneira especial de conversar e dizia: “quem sabe tu pensas assim...” E quando víamos tínhamos embarcado no vagão do trem do Liberato e lá estávamos redigindo a matéria dentro daquilo que ele queria, dentro daquilo que ele imaginava, sem nenhuma imposição.

O outro lado é o do escritor. Costuma-se dizer muitas vezes que se há uma proximidade entre o trabalho do jornalista e do escritor, há também um perigo imenso. Acabamos sugados pelo jornal. Toda a potencialidade que temos de identificação, do tempo disponível para escrever, acaba sendo roubado pelo jornal e sobra muito pouco para a nossa literatura. O Liberato encontrou uma saída extremamente inteligente e eficiente: ele virou cronista, ou seja, ele fazia jornalismo e ao mesmo tempo podia sair pela tangente e fazer um pouco de ficção. E, a partir daí, gradualmente, e isto me parece que é extremamente importante, ele chegou naquele momento em que resolvemos dar o grande salto, fazer a grande travessia na corda bamba da lona do circo, lançar um grande romance. E para ele, grande não é o modo de falar, é grande mesmo. Eu lembro que o Roque Jacob, num outro dia, quando estive lá com o Dilamar para conversarmos sobre o livro do Dilamar, o Roque disse que o Liberato havia lhe entregue um livro grande, umas mil páginas, que depois iriam dar umas 800 páginas. Era realmente um “tom de force” grande e que só quem, realmente, se prepara ao longo de anos consegue chegar a isto. E digo isto porque certamente para quem não conhece muito de perto literatura, partir para um romance “grande”, no sentido de que tem muito personagens, um enredo complexo, significa, realmente, muita disciplina, visualizar, concretizar muito bem em nossa cabeça o que se quer colocar no papel. Não sei com o Liberato trabalha, mas certamente ele, no mínimo, faz um mapa na cabeça, para não dizer no papel, colocar na cara da gente, pregar numa parede, trabalhar todos os dias, não matar o personagem na página vinte, para tê-lo vivo na de número duzentos e quarenta, que é sempre um risco que a gente corre e ao mesmo tempo enfrentar o dia-a-dia do jornal. Hoje, sem dúvida nenhuma, apesar de toda esta tecnologia disponível, o dia-a-dia do jornal é mais complicado, ele cobra mais da gente do que cobraria antigamente, no “Correio do Povo”, onde a gente até fazia alguns acordos com o Doutor Breno: a gente some três dias, ele finge que não vê, alguém bate o ponto pela gente, etc. Coisas que a gente tanto viveu, Liberato, na Redação do “Correio do Povo”. Portanto, neste sentido, parece-me que a homenagem proposta por esta Casa, através do Ver. Isaac Ainhorn ao Liberato Vieira da Cunha é mais do que justa, porque é, em primeiro lugar, alguém que deu todo a sua vida profissional a esta Cidade ou, a partir desta Cidade, ao Estado do Rio Grande do Sul; em segundo lugar, porque dar, neste momento, este salto de qualidade é sempre uma coragem, pois a gente nunca sabe o que vai acontecer; em terceiro lugar, porque, por trás da timidez aparente do Liberato, porque parece que ele está sempre fugindo, escondendo-se em um cantinho, ele, na verdade, é uma pessoa extremamente amiga. Eu tenho certeza de que se mais companheiros da Redação do “Correio do Povo”, aqui, estivessem, cada um teria, em algum momento, uma história para contar, quanto a um pequeno gesto, uma pequena palavra ou um sorriso do Liberato e que ajudou alguém, em determinado momento.

Portanto, Liberato, em meu nome particular e em nome dos companheiros do Partido Social Democracia, o PSDB, trago-te, aqui, o abraço e a homenagem, esperando que tu possas continuar dando a contribuição dupla: dentro do jornalismo, que nós tanto precisamos, e dentro da literatura. Tu mereces esta homenagem, e acho que, ao contrário do que às vezes tentam vender uma campanha de dizer que esta Casa fala demais, ou homenageia demais, eu acho que esse é o tipo de momento que realmente vale a pena termos este tipo de homenagem. O Prêmio Érico Veríssimo é um Prêmio que honra qualquer pessoa. O Liberato, que tantas vezes pode editar matérias sobre o Érico, e eu fui um dos que fez uma matéria editada pelo Liberato sobre o Érico Veríssimo, acho que hoje, além do Prêmio em si, o fato desse Prêmio se chamar “Érico Veríssimo” é alguma coisa a mais que acrescenta dentro dele. Muito obrigado.

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Convidamos a todos para assistirem à entrega do Prêmio Érico Veríssimo e vamos convidar o Ver. Isaac Ainhorn, que é o proponente da Sessão para que, conjuntamente com a Mesa da Câmara municipal e os Vereadores, faça a entrega do título.

 

(É feita a entrega do prêmio.) (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE: De imediato, concedemos a palavra ao homenageado, Liberato Vieira da Cunha.

 

O SR. LIBERATO FIGUEIREDO VIEIRA DA CUNHA: Sr. Presidente, (Menciona os demais componentes da Mesa.), Srs. Vereadores, demais autoridades aqui presentes, meus amigos, minhas senhoras e meus senhores.

O que é o passado, senão a conta de somar de todos os presentes que vivemos em rebelde intensidade? O que resta do tempo, senão a memória dos momentos em que existir foi um ato deliberado de consciência e plenitude? O que somos, senão a confluência de nossos sonhos, de nossas escolhas, do que ousamos querer, do que aprendemos a amar?

É num desses estuários de intensidade, plenitude e bem-querer que me sinto nesta hora. Uma generosa conspiração, capitaneada pelo eminente Ver. Isaac Ainhorn, e à qual aderiram ilustres pares seus, obrigou-me a uma rendição. Resistente por temperamento a homenagens, tive no entanto de capitular a esta, tamanha a honraria implícita no diploma que hoje recebo desta Casa.

Atribuo tão elevada distinção a duas circunstância felizes. A primeira delas decorre dos laços profundos que me unem a esta terra de adoção. Tão vigorosos se tornaram esses vínculos, e tão caros ao meu coração, que há muito cedi à doce compulsão de reparti-los, de confessá-los, de apregoá-los em letra de forma, com as ferramentas de meu ofício. Em dezenas de crônicas e contos esparsos, nos que recolhi em três livros dedicados a esses gêneros, no romance que acabo de publicar, surge, indestrutível, minha paixão por esta Cidade.

“Ah, Porto Alegre - declaro-me numa dessas páginas -, teu é o poder de seduzir-me a cada vez que me desvestes encantos esquecidos do teu corpo. Ah, Porto Alegre, como desamar-te?”

Pois é enamorado de sua beleza, inebriado de seus mistérios, que a vejo mulher, deusa e rainha, que me vejo vassalo de seus caprichos e de seus desejos. Pois é assim a vendo, e vendo-me assim, que sucumbi a seu fascínio, sem remoto temor de perder minha eleita, por mais longe me levem os caminhos do mundo.

Não é só contudo a essa gratíssima razão que credito o prêmio que ora me outorgam. Creio devê-lo igualmente à enorme admiração que devoto à obra imperecível de Érico Veríssimo, que empresta seu nome à láurea, valorizando e enriquecendo-lhe o significado. Conheci-o pessoalmente, aproximei-me dele menos do que devia, tolhido pela timidez do iniciante em uma arte em que ele se tornou mestre e paradigma. Guardo dele uma inapagável imagem de retidão e dignidade. Mais do que tudo conservo, porém, o prazer estético de lê-lo, de imergir no universo mágico de sua ficção. Não por outro motivo, Érico está presente, como Porto Alegre, em muito do que criei, ora como personagem, ora como inspirador e guia.

Falei antes em duas circunstâncias felizes, indissociáveis do gesto deste Legislativo. Mas há ainda uma terceira. Orgulha-me o fato de que este prêmio me é destinado pela Câmara Municipal de Porto Alegre, por iniciativa de um dos mais destacados de seus membros, que sabe aliar como poucos o dinamismo ao espírito público, sintonizar sua invulgar capacidade a um amplo conhecimento da magnitude dos desafios com que se defronta uma metrópole da importância social, econômica, política e cultural de Porto Alegre.

Ao Vereador Isaac Ainhorn, minha imensa gratidão. À Câmara de Porto Alegre, meu perene reconhecimento. Mais do que nunca, nesta quadra difícil da trajetória deste País, cumpre preservar o prestígio dos parlamentos em todos as suas esferas de atuação, zelar pela revigoramento de seu papel insubstituível nas sociedades pluralistas, lutar por seu engrandecimento como instituição inseparável da garantia das liberdades individuais e coletivas, que constituem o cerne do Estado de Direito.

É nessa trincheira que me coloca, senhores vereadores, como homem, como escritor, como jornalista. Dela não desertarei, pois não pode haver deserção da democracia que tão arduamente reconquistamos. Muito obrigado.

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Mais uma vez queremos deixar registrada a nossa satisfação em presidir este evento. Cumprimentamos o Ver. Isaac Ainhorn pela iniciativa e o nosso homenageado por este destaque merecido. Agradecemos a todos pela presença.

Estão encerrados os trabalhos da presente Sessão Solene.

 

(Levanta-se a Sessão às 16h05min.)

 

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